Monday, November 21, 2005

Poema de Breyten Breitenbach

A pedido de várias famílias, um poema do poeta branco sul-africano anti-apartheid Breyten Breitenbach:
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A VIDA NO BURACO

abençoados os filhos de Dimbaza,
de Welcome Valley, Limehill e Stinkwater * — mortos
de doença, subalimentação, miséria —
porque apuram o campo visual do senhor,
porque todos os dias voltam do inferno,
porque limpam o reino do Bóer — do Bóer e do seu Deus — da sua mão de Deus —
porque lhes pouparam a vida,
porque ser preto e viver é um erro político
porque tu negro na terra do sangue e do desprezo e do cartão de trânsito e do nojento cão poluis a terra do Bóer

abençoados os filhos de Dimbaza,
de Welcome Valley, Limehill e Stinkwater lançados
em buracos onde as formigas vêm comer
seus negrodentados sorrisos —
porque lhes dão brinquedos e garrafas de leite vazias
para que abram contentes seus sepulcros,
brinquedos e papel prateado que estaleja ao vento,
garrafas-de-leite-seios-secos de que o vento
chupa silvos para
atrair as toupeiras
— porque é escassa a carne —
e assim possam as crianças esquecer-se
de que já estão mortas
abençoados os mortos de Dimbaza
Welcome Valley, Limehill, Stinkwater comidos
pela terra, pois vieram e foram-se
discretamente entre boca e colher
sem conspurcarem o sol
abençoadas e afortunadas e santas as toupeiras
e os vermes e as formigas
na terra da luz clara
na terra do Bóer
na terra que o Senhor lhes distribuiu
para que limpem e fertilizem o solo
e o homem possa cevar-se e florir
e cuidar sua fruta e criar o seu gado
multiplicando-se forte belo e branco em louvor do seu Deus

* Dimbaza, Welcome Valley, Limehill, Stinkwater: campos criados pelo governo da África do Sul para concentrar os negros removidos das áreas habitadas pelo branco. (N. do T.)


traduzido por lchambel[em]yahoo.com.br

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